sábado, 31 de março de 2007

Domingo de Ramos

Começámos a Quaresma com os olhos postos nesta grande e importantíssima Semana. Dia a dia, fomo-nos preparando para ela em espírito de conversão. Hoje, começamos a celebrá-la em comunhão com a Igreja. E começamo-la com a entrada vitoriosa e aplaudida de Jesus em Jerusalém, num ambiente festivo de Páscoa. O Domingo de Ramos que hoje celebramos é então o limiar de uma semana recheada de revelação e de testemunho. Penetremos nela com uma verdadeira atitude cristã e com o desejo firme de fortalecer a conversão pascal.
Com ramos verdes nas mãos, a liturgia de hoje nos convida a aclamar Jesus como o Messias, que veio realizar as promessas dos profetas e instaurar o Reino de Deus. Também, nesta celebração, nos é anunciada a Paixão do Senhor, que nos mostra o grande gesto de amor dado pelo nosso Rei para a salvação da humanidade. Na certeza da vitória de Cristo, iniciemos a Semana Santa, fazendo memória da entrada triunfal de Jesus em Jerusalém. Cantemos confiantes:

1ª Leitura: Is 50, 4-7:
A primeira leitura apresenta-nos um profeta anónimo, chamado por Deus a testemunhar no meio das nações a Palavra da salvação. Apesar do sofrimento e da perseguição, o profeta confiou em Deus e concretizou, com teimosa fidelidade, os projectos de Deus. Os primeiros cristãos viram neste “servo” a figura de Jesus.

2ª Leitura: Filip 2, 6-11:
A segunda leitura apresenta-nos o exemplo de Cristo. Ele prescindiu do orgulho e da arrogância, para escolher a obediência ao Pai e o serviço aos homens, até ao dom da vida. É esse mesmo caminho de vida que a Palavra de Deus nos propõe.

Evangelho: Lc 22, 14-23, 56:
O Evangelho convida-nos a contemplar a paixão e morte de Jesus: é o momento supremo de uma vida feita dom e serviço, a fim de libertar os homens de tudo aquilo que gera egoísmo e escravidão. Na cruz revela-se o amor de Deus, esse amor que não guarda nada para si, mas que se faz dom total.

Para viver durante a semana:
«Hossana! Crucifica-O!...» Gritos de alegria! Gritos de ódio!... A mesma multidão! E o nosso grito hoje? Somos discípulos de Jesus quando tudo vai bem… e prontos a negá-l’O quando nos sentimos comprometidos com Ele? Durante a Semana Santa, tomemos o tempo de parar com Paulo a fim de revivificar a nossa fé em “Cristo Jesus imagem de Deus… abaixando-Se até à morte de Cruz… elevado acima de tudo…”. Ousemos proclamá-lo pela nossa vida “Cristo e Senhor para a glória do Pai”! Vivamos a Semana Santa na oração e na contemplação de Jesus Cristo, a essência do nosso ser e da comunhão de irmãos em Igreja!
Que o exemplo comovedor de Cristo nos ajude a examinar as linhas mestras da nossa vida e as regras do nosso comportamento.

quinta-feira, 29 de março de 2007

O perdão das ofensas

Senhor, quantas vezes tenho que perdoar? Com esta pergunta feita a Jesus, Ele não nos diz que perdoar seja fácil, senão que é um requisito absolutamente indispensável para a nossa vida. Poderíamos dizer que é um mandamento, porque nos diz para perdoar. De outra forma, o coração encontra-se como uma cidade rodeada pelo inimigo, a caridade rodeada pelo ódio e o progresso espiritual submergido num poço profundo. Por outro lado, não nos devemos preocupar pela correspondência do outro, se cada um de nós fizer o que nos compete. Cada um é diferente e, portanto, cada um dará contas a Deus do que fez com a sua vida e com as suas acções.
O nosso coração deve ser um castelo onde só reine Deus. Ele é amor, e como tal afasta o ódio. Se, pelo contrário, permitirmos que entre o ódio no nosso coração, Cristo abandonará o sítio que estava a ocupar dentro de nós porque não pode ser amigo de quem o odeia. Por esse motivo devemos trabalhar em amar, no lugar de odiar, compreender no lugar de pensar mal, perdoar no lugar de procurar a vingança. Odiando, matamos a nossa alma. O desejo de vingança significa que ser quer superar o outro em fazer o mal e isto em vez de sarar a situação. Peçamos a Cristo a graça de contar com um coração como o seu que saiba amar e perdoar apesar das grandes ou pequenas dificuldades da vida.

segunda-feira, 26 de março de 2007

Quaresma, uma recordação de como Deus nos quer

Toda a Quaresma, com o seu constante convite à conversão, é uma harmoniosa recordação de como Deus nosso Senhor nos quer, a todos e a cada um de nós, plenamente santos, absolutamente santos. Purificai-vos de todas as iniquidades, renovem o coração e o Espírito, diz-nos o Senhor.
A lei de santidade que nos exige e que nos obriga a todos, converte-se num imperativo ao qual nós não poderemos renunciar. Mas seríamos bastante ingénuos se esta lei de santidade a procurássemos viver afastados do que somos, da nossa realidade concreta, dos elementos que nos constituem, das vibras mais interiores do nosso ser. Seríamos ingénuos se nos atrevêssemos a discernir na nossa alma aquelas situações que podem estar verdadeiramente a impedir a nossa autêntica conversão. A conversão não é somente o colocar a cinza na cabeça, como o fizemos em quarta-feira de cinzas, a conversão não é guardar abstinência de carne, não é só fazer penitências ou dar esmolas. A conversão é uma transformação absoluta do próprio ser.
Quando o pecador se arrepende do mal que fez e pratica a verdade e a justiça, ele mesmo se salva e a sua vida afasta-se dos delitos cometidos; certamente viverá e não morrerá assim. Esta frase do profeta Ezequiel fala-nos da necessidade de chegar até aos últimos recantos da nossa personalidade no caminho da conversão. Fala-nos da importância de que não dique nada de nós afastado da exigência de conversão. E se nós nos quisermos perguntar qual é o primeiro elemento que temos que purificar na nossa vida, o elemento fundamental sem o qual a nossa existência não pode ver truncada a sua busca de santidade, creio que teríamos que entrar e atrever-nos a examinar os nossos sentimentos.
Quantas vezes os nossos sentimentos nos atraiçoam, quantas vezes a nossa afectividade nos impede de alcançar uma verdadeira conversão, quantos de nós, no caminho da santidade, nos vimos obstaculizados por algo que sentimos escapar-nos das nossas mãos, que sentimos afastar-nos da nossa liberdade, que são os nossos sentimentos. Os sentimentos que são uma riqueza que Deus coloca na nossa alma, acabam-se convertendo numa cadeia que nos atrapalha, que nos impede de raciocinar e de reagir; impede-nos de tomar decisões e de nos afirmarmos no propósito de conversão. A penitência dos sentimentos é o caminho que nos tem que acabar por levar em todas as Quaresmas, mais ainda, na Quaresma contínua que tem que ser a nossa existência, para o encontro autêntico com Deus nosso Senhor.
Jesus Cristo no Evangelho fala-nos da importância que tem o sermos capazes de dominar os nossos sentimentos para podermos alcançar uma autêntica conversão. A antiga lei falava que o que matava cometia pecado e era levado ao tribunal, mas Cristo não se conforma simplesmente com isto; Cristo vai mais além no que tem que ir fazendo plena a pessoa. Jesus Cristo convida-nos, como parte deste caminho de conversão, à purificação dos nossos sentimentos, à penitência interior quando nos diz: todo o que tenha raiva de seu irmão, será levado ao tribunal.
Em quantas ocasiões nós procuramos quem sabe que mortificações raras e andamos a pensar no que é que poderemos oferecer ao Senhor, e não nos damos conta de que levamos uma penitência incorporada em nós mesmos através dos nossos sentimentos. Não nos damos conta de que os nossos sentimentos se convertem num campo no qual a nossa vida espiritual muitas vezes naufraga.
Qual é o caminho para tudo isto? O caminho é o do exame: Se quando fores colocar a tua oferenda sobre o altar te recordares ali mesmo de que o teu irmão tem alguma coisa contras ti… Entrar constantemente dentro de nós mesmos e vigiar a nossa alma é o caminho necessário, para podermos então chegar a viver esta penitência dos sentimentos. É o caminho do qual não podemos prescindir para termos bem dominada toda a corrente que são os sentimentos, de maneira que não percamos nada da riqueza que ela nos possa trazer, mas tão pouco nos deixemos arrastar pela corrente, que por vezes nos pode afastar verdadeiramente do Senhor.
Para entrarmos verdadeiramente dentro de nós é necessário que a memória e a recordação se transformem como num espelho no qual a nossa alma está a ser examinada, percebida constantemente pela nossa consciência, para ver até que ponto o sentimento me está a enriquecer, ou até que ponto me está a atraiçoar. Até que ponto o sentimento me está a dar plenitude ou até que ponto o sentimento me está a prender a mim mesmo, ao meu egoísmo, às minhas paixões, às minhas conveniências.
Vigiar, estar atentos, recordar, mas ao mesmo tempo é fundamental que o caminho de conversão não passe simplesmente por uma vigilância, que poderia resultar para nós em algo obscuro e repressivo, senão que é necessário também, que o caminho de conversão passe por um enriquecimento. Se alguém tivesse que ter alguns sentimentos ricos, muito fecundos, esse teria que se um cristão, teria que ser um santo, porque somente, o autêntico cristão, potencia toda a sua personalidade impulsionado pela graça, para que não haja nada nele que fique sem se redimir, sem ser tocado pela Cruz de Cristo.
O caminho da conversão é difícil, exige uma grande abertura do coração, exige estar dispostos, em todos os momentos, a questionarmo-nos e a enriquecermo-nos. Façamos desta Quaresma um caminho de enriquecimento, um caminho de encontro mais profundo com Cristo, um caminho no qual o final, a Cruz de Cristo tenha tocado todos os espaços da nossa personalidade.

sexta-feira, 23 de março de 2007

V Domingo da Quaresma

Já adiantada a Quaresma, coloca-nos hoje perante Jesus que pode transformar completamente as nossas vidas, com a sua palavra e com o seu exemplo radical. A conversão é uma renovação interior e exterior que aumenta de intensidade, se experimentarmos um perdão absoluto, como aquele que vem no Evangelho. Assim a liturgia de hoje, centra-se, outra vez, na imagem de um Deus que ama e cujo amor nos desafia a ultrapassar as nossas escravidões para chegar à vida nova, à ressurreição. Agradecidos pelo dom da fé e do perdão, celebremos a comunhão com Jesus e entre nós, em comunidade, iniciando a nossa celebração cantando com alegria.

1ª Leitura: Is 43, 16-21:
A primeira leitura apresenta-nos o Deus libertador, que acompanha com solicitude e amor a caminhada do seu Povo para a liberdade. Esse “caminho” é o paradigma dessa outra libertação que Deus nos convida a fazer neste tempo de Quaresma e que nos levará à Terra Prometida onde corre a vida nova.

2ª Leitura: Filip 3, 8-14:
A segunda leitura é um desafio a libertar-nos do “lixo” que impede a descoberta do fundamental: a comunhão com Cristo, a identificação com Cristo, princípio da nossa ressurreição.

Evangelho: Jo 8, 1-11
O Evangelho diz-nos que, na perspectiva de Deus, não são o castigo e a intolerância que resolvem o problema do mal e do pecado; só o amor e a misericórdia geram activamente vida e fazem nascer o homem novo. É esta lógica, a lógica de Deus, que somos convidados a assumir na nossa relação com os irmãos.

Para viver durante a semana:
A mulher adúltera… “Esta mulher foi apanhada em flagrante delito de adultério…” “Aquela martirizou o seu filho…” “Aquela deixou-o morrer de fome…” “Aquela outra…” …e as nossas mãos já estão cheias de pedras para a lapidar. Esta semana, a convite de Jesus, comecemos por olhar onde se situa o nosso pecado… De seguida, em relação a todas estas mulheres de hoje condenadas sem apelo, abramos o nosso coração à compreensão… à misericórdia… e talvez ao apoio na sua angústia.
Reconhecemos e lamentamos, com frequência, que existe corrupção e injustiça. Inclusive, até nós podemos ser tentados a pertencer ao número daqueles que fazem jogo sujo… com a desculpa de que todos fazem assim. Mas, claro, esta não é a alternativa. Nós, cristãos, temos obrigação de mostrar sempre a cara lavada. E não temos outra alternativa, senão a de ir ao encontro dos nossos irmãos com o coração aberto aos seus problemas e necessidades. Vamos demonstrá-lo agora, quando sairmos para a rua. Que o Senhor nos ajude.

quinta-feira, 22 de março de 2007

Confiar em Deus é colocarmo-nos nas suas mãos

Confiar em Deus requer, de cada um de nós, que nos coloquemos nas suas mãos. Esta confiança em Deus, base da conversão do coração, que devemos procurar fazer nesta Quaresma, requer que automaticamente estejamos dispostos a apoiarmo-nos nele.
Cada um de nós, quando procura converter o seu coração a Deus nosso Senhor e procura aproximar-se dele, tem que passar por uma etapa de espera. Isto pode ser para a nossa alma particularmente difícil, porque embora em teoria estejamos de acordo em que a santidade é obra da graça, em que a santidade é obra do Espírito Santo sobre a nossa alma, teríamos que chegar a ver se efectivamente na prática, no mais fundo do nosso coração o temos presente.
A partir deste ponto de vista, a alma pode por vezes perder-se num campo bastante complexo e enredar-se em complicações interiores: de sentimentos e de lutas interiores; ou de circunstâncias que vêm de fora, que nos oprimem, que as sentimos como particularmente difíceis em determinados momentos da nossa vida. É nestas situações nas quais cada um de nós, para converter automaticamente o coração a Deus, não tem que fazer outra coisa mais, que confiar.
O curioso é que nós por vezes, neste caminho de conversão do coração, pensamos que é tudo uma obra de vivência pessoa, de arrependimento pessoal, de virtudes pessoais.
Estamos na Quaresma, começámos a fazer exercícios e fazemos também algumas penitências, mas qual é a nossa atitude interior? É a atitude de quem espera? É a atitude de quem verdadeiramente confia em Deus nosso Senhor todos os seus cuidados, todo o seu crescimento, todo o seu desenvolvimento interior? Ou a nossa atitude interior é antes uma atitude de ser eu o dono do meu crescimento espiritual?
Embora eu não seja capaz de me soltar totalmente a Deus nosso Senhor, a minha alma vai crescer, mas sempre até um limite, no qual de novo Deus se cruzar no meu caminho e me diga: Que bom teres chegado aqui, agora tens que confiar plenamente em mim. Então, a minha alma pode sentir medo e pode afastar-se; pode caminhar por outro lado e voltar a ir por outro caminho, e de novo vai acabar por se encontrar com Deus que diz: entrega-te a mim; uma outra vez, uma e outra vez.
Este é o caminho de Deus sobre todas e cada uma das nossas almas. E embora nós não sejamos capazes de dar esse presente, embora nós não sintamos que toda a conversão espiritual que tivemos não é no fundo senão a preparação para esse soltarmo-nos em Deus nosso Senhor, não estaremos realmente a chegar a nada. O esforço exterior só tem fruto quando a alma se solta totalmente em Deus, se deixa totalmente nele. Sem dúvida, todos somos conscientes do duro e difícil que é.
Peçamos a Jesus Cristo o fazer desta conversão do coração, um soltar, um entregarmo-nos plenamente no nosso interior e nas nossas obras a Deus. Sigamos o exemplo que Cristo nos dá na Eucaristia e transformemos o nosso coração num lugar no qual Deus nosso Senhor se encontre automaticamente como em sua casa, se encontra verdadeiramente amado e se encontra com o dom total de cada um de nós.

segunda-feira, 19 de março de 2007

Abrir o nosso coração a Deus

A nossa vida não é simplesmente uma série de circunstâncias, uma série de dias que vão passando uns atrás dos outros, senão que todos os dias da nossa vida são um dom de Deus, não só para nós, senão e sobretudo um dom de Deus para os demais, para aqueles que vivem connosco, para aqueles que vivem ao nosso lado. Um dom de Deus que requer, pela nossa parte, o reconhece-lo e tomarmos consciência de que efectivamente é um presente de Deus. e, permitir, como consequência, que no nosso coração haja um espírito agradecido, pelo facto de ser um dom de Deus.
Na História da Igreja, Deus nosso Senhor foi dando dons constantemente, e por vezes Ele revela-se de uma forma particular em algumas circunstâncias, muito normais, muito correntes, mas que se convertem de uma forma muito especial em dons de Deus para os irmãos. É Ele quem decide a homens e mulheres à sua Igreja que ajudem os demais a caminhar, que ajudem os demais a encontrarem-se mais profundamente com Cristo; é Ele quem decide fazer das nossas vidas um dom para os demais.
Certamente que isto requer, por parte de quem toma consciência de ser um dom de Deus para os demais, uma correspondência. Não basta dizer “eu entrego-me aos demais”, “eu sou um dom de Deus para os demais”, é preciso também, estar conscientes de que isto vai acontecer mesmo da nossa parte. Por vezes podemos conviver com o dom de Deus e não sermos conscientes de que o temos ao nosso lado e, não sermos assim conscientes de que Deus está junto de nós. Podemos então assim estar a conviver com o dom de Deus, não o reconhecendo contudo.
Em primeiro lugar é necessário ter os olhos abertos e o coração disposto a acolher o dom de Deus, devemos estar dispostos a servir os demais, em segundo lugar, estar dispostos a beber do cálice do Senhor, e em terceiro lugar, estar dispostos a ir com Cristo, como corredentores, pelo bem dos demais.
Corredentor, companheiro e servidor são então as características do coração que está disposto a reconhecer o dom de Deus e do coração que está disposto a ser dom de Deus para os nossos irmãos. A nós, então, corresponderia perguntarmo-nos: Sou eu também um corredentor? Tomo eu como minha a missão da Igreja, a missão de Cristo, que é salvar os homens? Sou companheiro de Cristo, ou seja, tenho-o frequentemente no meu coração, bebo do seu cálice, partilho tudo com Ele? A sua vida é a minha vida, os seus interesses são os meus interesses, as suas inquietudes as minhas? Sou servidor dos demais? Estou disposto a ser dos que servem, dos que ajudam, dos que colaboram, dos que cooperam, dos que se entregam, dos que dão sem esperar necessariamente uma recompensa?
Assim como o Filho do Homem não veio para ser servido senão para servir e dar a sua vida como resgate de muitos, temos nós a consciência de que este deve ser a imagem da nossa vida: corredentores e servidores de Cristo? Esta consciência, que nos converte em dom de Deus para os demais, é a que nos converte em colaboradores, em ajuda e em caminho de Deus para os homens, nossos irmãos.
Peçamos a Cristo que nos conceda abrir o nosso coração ao dom de Deus, mas também peçamos-lhe que nos permita abrir o nosso coração para que também nós, corredentores, companheiros e servidores, saibamos ser dom de Deus para os demais.

sábado, 17 de março de 2007

Quaresma, caminho de crescimento espiritual

A Quaresma, que se nos pode apresentar simplesmente como um caminho de penitência, como um caminho de dor, como um caminho negativo, não deve ser visto bem assim, muito pelo contrário. É um caminho sumamente positivo, ou pelos menos assim o deveríamos nós entender, como um caminho de crescimento espiritual. Um caminho no qual, cada um de nós se deve ir encontrando, cada vez com mais profundidade, com Cristo. Encontrarmo-nos com Cristo, no interior, no mais profundo de nós mesmos, é o que acaba por dar sentido a todas as coisas: as boas que fazemos, as más que fazemos, as boas que deixamos de fazer e também as más que deixamos de fazer.
No fundo, o caminho que Deus quer para nós, é um caminho de procura d’Ele, através de todas as coisas. Isto é o que nos diz o Evangelho, quando nos fala das obras de misericórdia. Quem dá de comer ao que tem fome, quem dá de beber ao que tem sede, no fundo não faz simplesmente algo bom, ou se comporta como os demais, senão que vai mais além. Está a falar-nos de uma busca interior que nós temos que fazer para nos encontrar-mos assim com Cristo: uma busca que temos, e que teremos que ir fazendo, realizando todos os dias, para que não nos fuja, por assim dizer, Cristo em nenhum dos momentos da nossa existência.
Como procuramos a Cristo? Quando é que somos capazes de abrir os nossos olhos para ver a Cristo? Até que ponto nos atrevemos a ir descobrindo, em tudo o que está ao nosso lado, Cristo? A experiência quotidiana vem-nos dizer que não é assim, que muitas vezes preferimos fechar os nossos olhos a Cristo e não nos encontrar-mos por isso com Ele.
Porque é que nos custa então reconhecer a Cristo? O que nos diz o Evangelho, é que o problema fundamental é que nós tenhamos a valentia, a disponibilidade, a exigência pessoa de reconhecer a Cristo. Não simplesmente para fazer o bem, que isso o podemos fazer todos, senão para reconhecer verdadeiramente a Deus. Saber colocar Cristo em todas as situações, em todos os momentos da nossa vida.
Isto, que nos pode parecer um caminho muito simples, é sem dúvida, um caminho duro e exigente, um caminho no qual podemos encontrar tentações. Então e qual será a principal tentação? A principal tentação neste caminho, é precisamente a tentação de não aceitar, com a nossa liberdade, que Cristo pode estar aí, ou seja a tentação do uso da liberdade.
Creio que se existe algo ao qual nós estejamos verdadeiramente apegados, é a nossa liberdade e é o que procuramos defender em todo o momento e conservar acima de tudo. Cristo diz-nos: “Cuidado, que a tua liberdade não te impeça de me reconheceres”. Quantas vezes o ajudar a alguém significa ter que deixar de ser eu próprio? Quantas vezes o ajudar alguém significa renunciar a nós mesmos? Tive fome e não me destes de comer… E tenho que ser eu quem te dá do meu comer, ou seja, tenho que renunciar. Tenho que ser capaz de me deter, de me aproximar de ti, de descobrir que tens fome e sede e por isso tenho de dar-te o que é meu.
Por vezes poderíamos pensar que Cristo só se refere à fome material, mas quantas vezes se aproximam de nós corações sedentos espiritualmente e nós preferimos seguir o nosso caminho; preferimos não comprometer a nossa vida, pois é mais fácil, assim não me meto em complicações, e evito muitos problemas.
Todos nós somos, de uma ou de outra forma, membros comprometidos na Igreja, membros que procuram a superação na vida cristã, que procuram ser melhores nos sacramentos, ser melhores nas virtudes, encontrando-se mais com o Senhor. Porque não começamos a procurá-lo quando Ele chega à nossa porta? Cuidado então com a principal das tentações: a de ter o coração fechado.
Isto é algo muito forte, e a Quaresma tem que ajudar a perguntar-nos e a colocarmos a abertura real do coração e ver porque é que o nosso coração fechado pela nossa liberdade não quer reconhecer a Cristo nos demais. Atrevamo-nos a ver verdadeiramente quem somos, como estamos a viver a nossa existência. Abramos o nosso coração de par em par, não permitindo assim que o nosso coração acabe sedento por se fechar em si mesmo.
Façamos do nosso caminho quaresmal, um caminho para Deus, abrindo o nosso coração, e estou seguro de que, sempre que abramos a nosso coração nos vamos encontrar com Nosso Senhor, com Cristo que nos diz o caminho pelo qual temos que seguir. Reconheci-te e por isso dou-me completamente e sou capaz de superar qualquer dificuldade… Abramos o coração, reconheçamos a Cristo, não permitamos que a nossa vida se feche em si mesma. Estas são então as três condições fundamentais para que possamos verdadeiramente ter o Senhor na nossa existência. De outra forma, quem sabe que imagem temos de Deus e não se trata de fazer Deus à nossa imagem, senão de nós próprios nos fazermos imagem de Deus.
Que a publicidade à santidade, que é a Quaresma, seja um reclame ao nosso coração tão aberto, tão generoso e tão disponível que não tenha medo de reconhecer a Cristo em todas e em cada uma das situações pelas quais atravessamos; em todas e cada uma das exigências, que Cristo, venha a pedir a nossa vida quotidiana. Não se trata simplesmente de esperar até ao juízo final para que nos digam: “à tua direita e à tua esquerda”; é no caminho quotidiano, que temos que começar a abrir os olhos e o coração e a reconhecer verdadeiramente a Cristo.

sexta-feira, 16 de março de 2007

IV Domingo da Quaresma

Este Domingo é marcado por um clima de alegria festiva inerente à reconciliação a que a Igreja nos convida. De facto, a verdadeira alegria brota de um coração reconciliado com Deus e com os irmãos. A liturgia de hoje convida-nos então à descoberta do Deus do amor, empenhado em conduzir-nos a uma vida de comunhão com Ele. Somos convidados a nos alegrar na bondade do Senhor, que, misericordioso e compassivo, vem ao nosso encontro, acolhendo-nos e perdoando-nos. Deixemo-nos pois tocar pelo amor misericordioso do Senhor que sempre nos espera com ternura, qualquer que tenha sido o trajecto da nossa vida. Com esse espírito de contentamento, iniciemos nossa celebração cantando.

1ª Leitura: Jos 5, 9a.10-12:
A primeira leitura, a propósito da circuncisão dos israelitas, convida-nos à conversão, princípio de vida nova na terra da felicidade, da liberdade e da paz. Essa vida nova do homem renovado é um dom do Deus que nos ama e que nos convoca para a felicidade.

2ª Leitura: 2 Cor 5, 17-21:
A segunda leitura convida-nos a acolher a oferta de amor que Deus nos faz através de Jesus. Só reconciliados com Deus e com os irmãos podemos ser criaturas novas, em quem se manifesta o homem Novo. São Paulo convida então os cristãos do seu tempo a entrarem nesse movimento de reconciliação para poderem beneficiar largamente dos frutos da redenção.

Evangelho: Lc 15, 1-3.11-32:
O Evangelho apresenta-nos o Deus/Pai que ama de forma gratuita, com um amor fiel e eterno, apesar das escolhas erradas e da irresponsabilidade do filho rebelde. E esse amor lá está, sempre à espera, sem condições, para acolher e abraçar o filho que decide voltar. É um amor entendido na linha da misericórdia e não na linha da justiça dos homens.

Para viver durante a semana:
A segunda parte da parábola deste domingo é uma crítica à conduta do filho mais velho… uma crítica da nossa própria conduta, nós que estamos ao serviço de Deus nem nunca ter desobedecido gravemente às suas leis. Somos observantes, fazemos o que devemos fazer, mas depressa podemos mostrar-nos duros e com desprezo: quando fechamos a porta ao nosso filho que…, quando cortamos as pontes com um parente…, quando olhamos de lado a divorciada… E, entretanto, Deus não nos julga! Ele é paciente, suplica-nos para compreender: “Tu, meu filho, estás sempre comigo…”
Vamos fazer o projecto de examinar com regularidade a nossa consciência, pedindo ao Senhor a força necessária para abandonarmos tudo o que não esteja em harmonia com a sua vontade e a coragem para perdoar e acolher todos os que nos magoaram, de modo que no nosso coração não subsistam quaisquer resquícios de ressentimento. Não esqueçamos que o homem mede-se pela capacidade de perdoar, e que só os medíocres não perdoam.

quinta-feira, 15 de março de 2007

Os sapos

Um dia, os sapos decidiram fazer uma competição. Como os desportos radicais estavam na moda, resolveram subir até ao cimo da torre mais alta da cidade.
Chegado o dia, começou a competição. Ei-los atarefados para ver qual deles conseguia subir mais alto. A multidão que presenciava o espectáculo, não acreditava que conseguissem uma tal proeza. Toda a gente dizia:
- Não irão conseguir!
Os sapos, ao ouvirem as vozes pessimistas da multidão, começaram a desistir, um após o outro. Mas havia um que persistia e continuava a subida.
As pessoas cada vez mais pessimistas diziam:
- Não irão conseguir!
Desistiram os últimos, menos aquele sapo que continuava tranquilo, embora ofegante. E chegou até ao ponto mais alto da torre.
No final da competição, as pessoas quiseram saber o segredo da vitória. Descobriram então que era surdo.

Por vezes, temos de fazer orelhas moucas aos pessimistas, que nos convidam a deixar de lutar pelo bem….

sábado, 10 de março de 2007

III Domingo da Quaresma:

Sabemos que a Quaresma insiste frequentemente no valor da conversão. Hoje, a liturgia da palavra vai dizer-nos que a conversão é urgente e que não devemos por isso deixá-la para amanhã. O amor compassivo e misericordioso de Deus deve levar-nos a viver então com uma grande densidade e fecundidade espiritual. Longe de nós sermos como a figueira estéril. Temos de responder devidamente aos dons e ao carinho que recebemos de Deus. Com verdadeiros sentimentos e desejos de conversão, vamos começar a nossa celebração, cantando com alegria.

1ª Leitura: Ex 3, 1-8a. 13-15:
A primeira leitura fala-nos do Deus que não suporta as injustiças e as arbitrariedades e que está sempre presente naqueles que lutam pela libertação. É esse Deus libertador que exige de nós uma luta permanente contra tudo aquilo que nos escraviza e que impede a manifestação da vida plena. A leitura recolhe um dos encontros pessoais e surpreendentes de Deus com Moisés. Deus vai ter com ele, diz-lhe que não consente por mais tempo a opressão dos Faraós sobre o seu povo e pede-lhe a sua colaboração para tirar este da escravidão.

2ª Leitura: 1 Cor 10, 1-6.10-12:
A segunda leitura avisa-nos que o cumprimento de ritos externos e vazios não é importante; o que é importante é a adesão verdadeira a Deus, a vontade de aceitar a sua proposta de salvação e de viver com Ele numa comunhão íntima.

Evangelho: Lc 13, 1-9:
O Evangelho contém um convite a uma transformação radical da existência, a uma mudança de mentalidade, a um re-centrar a vida de forma que Deus e os seus valores passem a ser a nossa prioridade fundamental. Se isso não acontecer, diz Jesus, a nossa vida será cada vez mais controlada pelo egoísmo que leva à morte.

Para viver durante a semana:
“Convertei-vos!” Sim, mas eu não roubei, nem matei, levo uma vida honesta… Porque deveria eu converter-me? Precisamente, Cristo quer que sejamos diferentes das pessoas que não têm nada a apontar… Um monge do Oriente compara o crente a uma casa. Se sou um baptizado, não somente generoso mas sem compromisso, então dou a Cristo a chave da porta das traseiras e ele entra na minha casa como íntimo, como Ele quer. Se eu O deixar entrar pela porta da frente, quando outros estão na casa, então ficaremos pelos gestos de delicadeza e pelas conversas de rotina. As questões mais directas tornar-se-ão impossíveis. É à porta das traseiras que Cristo vem bater. Sobretudo durante os quarenta dias da Quaresma… Ouvimos a advertência de que a nossa vida não pode dissipar-se esterilmente. Exortou-se-nos a uma vida vigilante, que seja um autêntico acto de culto através da nossa conduta diária, embora conscientes da nossa fragilidade. Agora, regressamos à nossa vida para mostrarmos o que vale a nossa vocação. Tal como a Moisés, também Deus nos envia e nos acompanha… Será que cada um de nós tem a certeza disto?

quinta-feira, 8 de março de 2007

A lição da borboleta

Um homem achou o casulo de uma borboleta. E, no dia em que apareceu uma pequena abertura no casulo, sentou-se e observou a borboleta por várias horas, enquanto ela se esforçava em introduzir o seu corpo através daquele pequeno buraco. Depois, parecia parar sem nenhum progresso. Parecia que ela tinha chegado até onde ela podia e não iria mais longe.
Então, o homem decidiu ajudar a borboleta. Pegou numa tesoura e retirou o que restava do casulo. A borboleta, assim, apareceu facilmente, mas tinha o corpo inchado e as pequenas asas enrugadas.
Ele continuou a olhar a borboleta, pois esperava que, a qualquer momento, as asas crescessem e se expandissem para suportar o corpo, que iria contrair-se com o tempo.
Nenhuma das duas coisas aconteceram. Aliás, a borboleta passou o resto da sua vida gatinhando com o corpo inchado e as asas enrugadas. Nunca conseguiu voar. O que tinha feito o homem com a melhor das intenções, e que ele não pode compreender, foi que o casulo restrito, a luta e o sufoco para sair pela pequena abertura, eram as formas que a natureza tinha feito para forçar o fluído do corpo da borboleta a passar para as asas. Só assim ela estaria pronta para voar…
Às vezes as lutas são necessárias na vida. Se Deus nos permitisse passar a vida sem nenhum obstáculo, nós seríamos “deficientes”. Não seríamos suficientemente fortes e nunca poderíamos “voar”.
Devemos lutar por uma vida condigna e não desistir nunca das lutas. Depois, sim, poderemos “voar”. É então assim necessário dar às coisas o seu tempo e o seu exacto valor.

sábado, 3 de março de 2007

Reflectir sobre a nossa própria vida

O tempo da Quaresma, de uma forma especial, leva-nos a reflectir sobre a nossa própria vida. Exige a cada um de nós que chegue ao centro da se mesmo e se coloque a examinar o que já percorreu da própria vida. Porque quando vemos a vida de outras pessoas que caminham ao nosso lado, pessoas como nós, com defeitos, debilidades, necessidades, e nas quais a graça do Senhor vai dando plenitude à sua existência, a vai fecundando, vai fazendo de cada minuto da sua vida um momento de fecundidade espiritual, deveríamos questionar-nos muito seriamente sobre o modo no qual se deve realizar em nós a acção de Deus. Será que é Deus que realiza em nós o caminho de transformação e de crescimento? Será que é Deus que torna eficaz em nós a graça?
A acção de Deus realiza-se segundo a imagem do Profeta Isaías: assim como a chuva e a neve descem do céu, regam a terra e depois de a terem feito fecunda para se poder semear, sobem outra vez ao céu.
A acção de Deus na Quaresma, de uma forma muito particular, desce sobre todos os homens para assim dar a todos e a cada um uma muito especial ajuda para a fecundidade pessoal. A semente que se semeia e o pão que se come, é realmente o nosso trabalho, é aquilo que nós fazemos, mas necessita sempre da graça de Deus. Isto é uma verdade que nunca poderemos esquecer: é Deus quem torna eficaz a semente, e de nada serviria a semente ou a terra se estas não fossem fecundadas, regadas pela graça de Deus.
Cada um de nós tem que chegar a entender isto e a não olhar tanto para as sementes que cada um de nós tem. Não temos que olhar as sementes que temos nas mãos, senão a fecundidade que vem de Deus Nosso Senhor. É então uma lei fundamental da Quaresma o aprender a receber no nosso coração a graça de Deus, o esforço que Deus fez e continua a fazer com cada um de nós.
Jesus Cristo, no Evangelho também nos dá outro dinamismo muito importante da Quaresma, que é a resposta que cada um de nós dá à graça de Deus. Não basta a acção da graça, porque a acção da graça não substitui a nossa liberdade, não substitui o nosso esforço que tem de brotar única e exclusivamente de nós próprios. Cristo coloca-nos em sentinelas diante da auto-suficiencia, mas também sobre a passividade. Diz-nos que temos que aprender a viver a recepção da graça em nós, sem auto-suficiência e passividade.
Contra a auto-suficiência, diz-nos o Senhor no Evangelho: “não oreis como oram os pagãos que pensam que com muito falar vão ser escutados”. Jesus diz-nos: têm que permitir que o seu coração se abra, que o coração seja o que fala a Deus nosso Senhor. Porque Ele, antes que lhe peças algo, já sabe aquilo de que necessitas. Mas ao mesmo tempo há que cuidar a passividade. A cada um de nós cabe-nos actuar, fazer as coisas, cabe-nos o levar as situações tal e qual como Deus nos vai pedindo. Isto é, quem sabe, um esforço muito difícil, muito sério, mas nós temos que actuar imitando a Deus nosso Senhor, de nosso Pai que está no céu. Este caminho supõe para todos nós a capacidade de ir trabalhando apoiados sempre na oração.
Um dos salmos diz-nos: “os olhos do Senhor cuidam do justo e ao seu clamor estão atentos os seus ouvidos”. Se nós aprendemos a ver assim todo o trabalho espiritual, do qual a Quaresma é um momento muito privilegiado, se aprendêssemos a ver tudo isto como um trabalho que Deus vai realizando na alma e que ao mesmo tempo vai produzindo no nosso interior um dinamismo de transformação, de confiança, de scuta de Deus, de mudança de vida; um dinamismo de aproximação aos demais, de perdão, de abertura do coração. Se tivéssemos tudo isto bem claro, também nós estaríamos a realizar o que diz o salmo: “o Senhor livra o justo das angústias”.
Quantas vezes a angústia que vai na alma, provem, acima de tudo, de que nós queremos ser quem realiza as coisas, as situações e esquecemo-nos de que não somos nós, senão Deus? Mas quantas vezes também, a angústia vem à alma, porque queremos deixar tudo a Deus, quando a nós nos toca colocar muito da nossa parte? Inclusive, quando a nós nos toca colocar algo que nos faça arriscar, que nos comprometa; algo que nos faça dizer: será assim ou não será assim?, e sem dúvida, eu sei que o tenho que fazer. É a semente que há que semear.
Quando o semeador, tem uma semente e a coloca no campo, não sabe o que se vai passar com ela. Confia na chuva que a vai fazer fecundar. Quantas vezes a nós nos poderia passar a ideia de que temos a semente mas preferimos não a enterrar, preferimos não confiar na chuva, porque se ela falta, o que é que fazemos?
Sem dúvida, Deus volta a repetir: “O Senhor livra o justo das suas angústias”. Quais são as angústias? De auto-suficiência? De passividade? De medo? Aprendamos nesta Quaresma a permitir que o Senhor chegue ao nosso coração e encontre nele uma terra que é capaz de apoiar-se plenamente em Deus, mas ao mesmo tempo, capaz de arriscar.

sexta-feira, 2 de março de 2007

II Domingo da Quaresma

Metidos em cheio já no processo quaresmal, este domingo vem lembrar-nos de Que Deus é amigo, que faz aliança connosco como a fez com Abraão, e que devemos caminhar pela vida com dignidade, com entusiasmo e sem es1quecermos que também somos cidadão do céu. Tudo isto é posto de relevo pela transfiguração de Jesus, experiência que espantou verdadeiramente os discípulos porque os apanhou de surpresa. Será assim tão deslumbrante e arrebatadora a contemplação de Deus? Contemplando o Cristo Transfigurado, iniciemos a nossa celebração cantando com alegria:

1ª Leitura: Gen 15, 5-12.17-18:
A primeira leitura apresenta-nos Abraão, o modelo do crente. Com Abraão, somos convidados a “acreditar”, isto é, a uma atitude de confiança total, de aceitação radical, de entrega plena aos desígnios desse Deus que não falha e é sempre fiel às promessas.

2ª Leitura: Filip 3, 17-4,1:
A segunda leitura convida-nos a renunciar a essa atitude de orgulho, de auto-suficiência e de triunfalismo, resultantes do cumprimento de ritos externos; a nossa transfiguração resulta de uma verdadeira conversão do coração, construída dia a dia sob o signo da cruz, isto é, do amor e da entrega da vida.

Evangelho: Lc 9, 28b-36:
O Evangelho apresenta-nos Jesus, o Filho amado do Pai, cujo êxodo (a morte na cruz) concretiza a nossa libertação. O projecto libertador de Deus em Jesus não se realiza através de esquemas de poder e de triunfo, mas através da entrega da vida e do amor que se dá até à morte. É esse o caminho que nos conduz, a nós também, à transfiguração em Homens Novos.

Para viver durante a semana:
Este é o meu Filho, o meu Eleito: escutai-O… O catecismo de muitos de entre nós está bem distante, a nossa bagagem religiosa talvez esteja leve: eis a Quaresma, a ocasião para recuperar energias. Como? Trata-se de ir às fontes, às raízes, aos fundamentos! Esta fonte é Jesus Cristo. “Escutai-O”, diz a voz que se faz ouvir das nuvens: vinde beber a sua Palavra! Abrimos o Livro onde corre esta fonte de água viva? Será que ao lermos os Evangelhos – este ano o Evangelho de Lucas – abrimos os ouvidos e deixamo-nos pôr em questão pelo Mestre?
Habitados pelo Espírito Santo desde o Baptismo, conscientes da sua acção em nós ao longo da vida, deixemos que Ele nos vá aos poucos transfigurando para que as nossas palavras e atitudes deixem transparecer um pouco de quem em verdade somos filhos de Deus, embora ainda de um modo imperfeito, na sua divindade.